Sunday, September 10, 2006

Drive Thru

— ...pra fora!
Fêmea que sabe bater a porta na cara como ninguém; tipo que faz um homem pré-erigir mentalmente, séculos antes do evento real, uma infinidade de portas batendo feito aquelas moças bonitas do nado sincronizado.
— ...pra fora!
E lá se vão as menininhas graciosas batendo uma após a outra na cabeça. Bateu mesmo? Ainda não? Então vamos lá, garotas, dá tempo pra mais uma fileira mental de pá-pá-pá.
Páááá.

Estou sozinho. O botão do elevador, sempre cumprimentado individualmente por cada membro de um grupo de espectadores de dez pessoas, agora está em silêncio. Só para ter certeza, aperto mais duas vezes.
No elevador fito-me no espelho com caprichos estranhos. Amo essa palavra do inglês, não sei se tem tradução, sou titubeante na língua mater: purposeless. Estou purposeless, indecentemente purposeless. Não, errante não presta.

Porra de purposeless. Estou quase no primeiro andar e cadê o dicionário. Suicídico, com meu purposeless travado na garganta, chego na garagem e meu Pálio jururu parece a piada mais divertida do mundo.
Por conveniência, moro em Copacabana, a do postal da década de cinqüenta. Lido é para as conversas veladas com meu carteiro. Duas horas da manhã e o Drive Thru está em total atividade. — Perdido, sem arrimo, desnorteado? — Chove fino e a tradução entalada desespera, mais ainda por não ter nenhum vício digno em meu caráter no qual capturar tanto desespero. Nunca tive cigarros nos bolsos da calça ou garrafas alcoólicas dentro dos cilindros invisíveis das mãos. Nem o chiclete, arrasa-quarteirão estomacal. Não conheci o passatempo de ser adulto.

Mas o Drive Thru está a pleno vapor. — Homem sem sentido, incerto? — O Ministério da Saúde adverte: fumar provoca câncer de mama. Composição química: alcatrão, seis miligramas; nicotina, zero ponto seis miligramas, monóxido de carbono, oito miligramas. Se beber não dirija, se dirigir, não beba. As gotas de chuvas se tornam mais incomodativas; quase não percebo um carro esporte que pára na minha frente e oferece uma de suas portas à chuva.

Drive Thru. — Onde deixei meus raciocínios? Ah, incerto! — Homem incerto numa estrada escura. Não, minha existência é menos cafona do que isso. Primamos pelo trabalho impecável, nossos funcionários nunca bebem em serviço. Um cigarro corresponde a cinco minutos e meio perdidos na vida de um indivíduo. Um sujeito desamparado. Tampouco. Suo o suor correto, sais imaculados, sais sóbrios e lúcidos, fruto das fisiologias que temem a Deus. As órbitas dos olhos também pululam, mas é pulular saudável, protegido pelo acaso são, veículo divino. Meu filho, isso é coisa do demônio! — Um cara sem objetivo, vagabundo, mundeiro.
Já fui longe demais; não posso mais dirigir. Cuidadosamente aproximo o carro de uma esquina silenciosa e familiar. Dois olhos vermelhos, mas agradáveis, me recebem através do vidro.

— Lola, sabe o que um cara purposeless pode fazer numa noite como essa?
Aliviado, abro a porta e deixo a madrugada entrar.
[o que sobrou de 2005]

4 Comments:

Blogger Constanza said...

não me importava em ter sido eu o autor deste.

ainda. até dia 18. pois nao deu certo, de fato. marque algo com a constanza e iremos, chame a alice também.

9:01 AM  
Blogger Constanza said...

é o ficas, acima

9:02 AM  
Blogger Constanza said...

caramba, o meu nome anda BOMBANDO nesses comentários, hein.
hehehe
gostei muito joão! visualizei direitinho cada pecinha desse jogo que você sabe criar tão bem. e nossos textos, cadê?

8:19 PM  
Anonymous Anonymous said...

Obrigado por intiresnuyu iformatsiyu

8:59 PM  

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