Navalha Cega
Quase
Nos próximos instantes, farei circular pela mesa uma pilha de recortes de revistas com vultos feminis. Ou antes, resquícios do que já foi uma mulher ou do que será uma, dependendo da resposta do meu leitor à pergunta “o senhor se considera uma pessoa feliz?”. De qualquer forma, recortes de recortes. Temos lascas de sorrisos estragados, buços insuspeitos e olhos que pululam com os feixes da lâmpada de estudo. São formas inúteis, mas essas arbitrariedades de poder descontextualizar pernas, orelhas e omoplatas me proporcionam a mesma diversão que goza a criança brincando de esquartejador com um Mr. Potatohead. Evado-me desta palavra – esquartejador - para evitar associações decisivas na mente do pervertido precipitado (pois não há nada pior e mais depravado do que um pervertido que reconhece outro); quero poder ir até o fim sem que cravem o indicador emporcalhado na minha boca. Além do mais, o esquartejador vai procurar sua matéria prima na carne bruta ainda viva, enquanto busco a minha nos restos perdidos dos sonhos do próprio esquartejador. Vejam bem, tudo é puramente quimérico; doutores, os ângulos das minhas fantasias se encontram em alinho angelical comovedor. Toda essa concretização em forma de fotos é apenas uma representação inocente. Nunca degluti papel.
Lá
Esta é Janaína. Armei as pernas de uma modelo espanhola no tronco de uma atriz húngara de teatro, dei o rosto desolador de uma menina bósnia que encontrei na seção de obituários num jornal e arrochei à imagem os belos olhos verdes e miúdos de minha irmã. O riso vem da França, de alguma reportagem faits divers, creio. Aqui jazem todos os limites e sombras possíveis de Janaína, sendo inútil encontrar maiores ambigüidades além daquelas que mão a trêmula, desfiando seus contornos com uma tesoura, escancara.
Lá
Esta é Janaína. Armei as pernas de uma modelo espanhola no tronco de uma atriz húngara de teatro, dei o rosto desolador de uma menina bósnia que encontrei na seção de obituários num jornal e arrochei à imagem os belos olhos verdes e miúdos de minha irmã. O riso vem da França, de alguma reportagem faits divers, creio. Aqui jazem todos os limites e sombras possíveis de Janaína, sendo inútil encontrar maiores ambigüidades além daquelas que mão a trêmula, desfiando seus contornos com uma tesoura, escancara.
Janaína gosta de teatro, Janaína gosta do zepelim enorme cujo retorno filmes fantasiosos pressagiam, Janaína gosta de carnaval. Todos, menos Janaína, gostam de Janaína inteiramente nua. Por alto, Janaína é um arroubo de lubricidade quando o pano cai. No papel, Janaína é celulose.
Encontro, por acaso, Janaína na minha cama. Não sei o que faz, mas farfalha qual serrote de fio embotado -- uma velha alucinada brigando com algo que não está lá. Janaína é mínima. Enquanto todo mundo que quer Janaína deflorável se ocupa em despi-la em um grande mosaico de igreja, Janaína ronca num sono profundo, fazendo uma única tira modesta e solitária de papel colorido bruxulear.
1 Comments:
nossa, maravilhoso!
de onde surgiu essa idéia?
um dos que mais gostei, sem dúvida!
continua continua que eu tô gostando!
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